MAYOMBE - EXERCÍCIOS COMENTADOS 1 - PRIMEIRA FASE FUVEST


 (FUVEST 2017) Observe a imagem e leia o texto, para responder às questões de 1 a 3

O Comissário apertou-lhe mais a mão, querendo transmitir-lhe o sopro de vida. Mas a vida de Sem Medo esvaía-se para o solo do Mayombe, misturando-se às folhas em decomposição.
[…] Mas o Comissário não ouviu o que o Comandante disse. Os lábios já mal se moviam.
A amoreira gigante à sua frente. O tronco destaca-se do sincretismo da mata, mas se eu percorrer com os olhos o tronco para cima, a folhagem dele mistura-se à folhagem geral e é de novo o sincretismo. Só o tronco se destaca, se individualiza. Tal é o Mayombe, os gigantes só o são em parte, ao nível do tronco, o resto confunde-se na massa. Tal o homem. As impressões visuais são menos nítidas e a mancha verde predominante faz esbater progressivamente a claridade do tronco da amoreira gigante. As manchas verdes são cada vez mais sobrepostas, mas, num sobressalto, o tronco da amoreira ainda se afirma, debatendo-se. Tal é a vida. […]
Os olhos de Sem Medo ficaram abertos, contemplando o tronco já invisível do gigante que para sempre desaparecera no seu elemento verde.
Pepetela, Mayombe.

1. Considerando-se o excerto no contexto de Mayombe, os paralelos que nele são estabelecidos entre aspectos da natureza e da vida humana podem ser interpretados como uma
a) reflexão relacionada ao próprio Comandante Sem Medo e a seu dilema característico entre a valorização do indivíduo e o engajamento em um projeto eminentemente coletivo.
b) caracterização flagrante da dificuldade de aceder ao plano do raciocínio abstrato, típica da atitude pragmática do militante revolucionário.
c) figuração da harmonia que reina no mundo natural, em contraste com as dissensões que caracterizam as relações humanas, notadamente nas zonas urbanizadas.
d) representação do juízo do Comissário a respeito da manifesta incapacidade que tem o Comandante Sem Medo de ultrapassar o dogmatismo doutrinário.
e) crítica esclarecida à mentalidade animista – que tende a personificar os elementos da natureza – e ao tribalismo, ainda muito difundidos entre os guerrilheiros do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).

ALTERNATIVA A
O trecho dado foi extraído do final do Capítulo V, quando Sem Medo elabora suas últimas reflexões sobre o olhar individual e a vida do coletivo comparados ao tronco da amoreira e as manchas verdes de suas folhas. São pensamentos que chegam ao leitor por uma espécie de discurso indireto livre anunciado (“o Comissário não ouviu o que o Comandante disse. Os lábios já mal se moviam.”). O “sincretismo” promovido pela natureza (pelo Mayombe!) é comparado ao grupo de guerrilheiros e sintetiza a militância do comandante pela união das diferenças, registrado ao largo dos capítulos em seu frequente combate ao ” tribalismo”.     

2. Consideradas no âmbito dos valores que são postos em jogo em Mayombe, as relações entre a árvore e a floresta, tal como concebidas e expressas no excerto, ensejam a valorização de uma conduta que corresponde à da personagem
a) João Romão, de O cortiço, observadas as relações que estabelece com a comunidade dos encortiçados.
b) Jacinto, de A cidade e as serras, tendo em vista suas práticas de beneficência junto aos pobres de Paris.
c) Fabiano, de Vidas secas, na medida em que ele se integrava na comunidade dos sertanejos, seus iguais e vizinhos.
d) Pedro Bala, de Capitães da Areia, em especial ao completar sua trajetória de politização.
e) Augusto Matraga, do conto “A hora e vez de Augusto Matraga”, de Sagarana, na sua fase inicial, quando era o valentão do lugar.
ALTERNATIVA D
Apesar de serem legítimos representantes de certos segmentos sociais, João Romão, Jacinto e Fabiano não estabelecem relação com o coletivo, no desenvolvimento das narrativas às quais pertencem. O projeto de João Romão é individualista, a vida de Jacinto não se descola de sua classe social abastada, apesar do movimento de retomada da vida junto à natureza,  e Fabiano é um segregado social despolitizado, apesar da gradativa tomada de consciência de sua condição. Augusto Matraga reconhece as relações que se estabelecem entre o indivíduo e o entorno coletivo, ainda que sua busca seja individual. Contudo, essa tomada de consciência se verificará a partir de certo ponto da narrativa, em uma fase de redenção e transformação da personagem, e não em sua “fase inicial”, como se afirma na alternativa E.    Pedro Bala é a personagem mais adequada à comparação provocada pelo enunciado, principalmente pela politização gradativa dada pelo reconhecimento das individualidades de seu grupo.


3. Mayombe refere-se a uma região montanhosa em Angola, dominada por floresta pluvial densa, rica em árvores de grande porte, e localizada em área de baixa latitude (4o 40’S). Levando em conta essas características geográficas e vegetacionais, é correto afirmar que
a) esse tipo de vegetação predomina na maior parte do continente africano, circundando áreas de savana e deserto.
b) se trata da única floresta pluvial sobre áreas montanhosas, pois esse tipo de floresta não ocorre em outras áreas do mundo.
c) a vegetação da região é semelhante à da floresta encontrada, no Brasil, na mesma faixa latitudinal.
d) nessa mesma faixa latitudinal, no Brasil, há regiões áridas, de altas altitudes, em que predominam ervas rasteiras.
e) tais florestas pluviais só ocorrem no hemisfério sul, devido ao regime de chuvas e às altas temperatura
ALTERNATIVA C
QUESTÃO QUE SE DESCOLA DA LITERATURA E EXIGE CONHECIMENTOS DE GEOGRAFIA FÍSICA.
Em Mayombe, de Pepetela, há muitas possibilidades abertas para a exploração, em questões,  de outros campos do conhecimento. História, Geografia, Sociologia, Atualidades. Um desafio para o estudante brasileiro, em boa parte afastado dos estudos acerca do continente africano. Uma excelente estratégia seria estudar as características geopolíticas e cartográficas de Angola, assim como inteirar-se acerca de seus dialetos.      



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