MAYOMBE - SÍNTESE POR CAPÍTULO 1: A MISSÃO


A missão

Reunião dos primeiros 14 guerrilheiros na floresta, em Mayombe (entre Cabinda, província de Angola, ao norte,  e a República do Congo – mapa). A principal ação do capítulo é a prisão de um grupo de trabalhadores que, sob comando dos colonizadores portugueses, extrai madeira das região.  Por meio de diálogos entre os combatentes registram-se a “missão” do grupo e algumas diferenças de mentalidades e objetivos. Além disso, nessa apresentação geral, também das personagens, surgem as primeiras referências às suas tribos de origem e os conflitos entre elas. Quanto ao enredo, em uma primeira investida guerrilheira, por emboscada, dezesseis inimigos cairão mortos. Vejamos:
[...]
O Comissário mediu as palavras, antes de falar.
— Penso que deveríamos aproveitar esta ocasião. Podíamos apanhar os trabalhadores, recuperar a serra, que é leve de transportar, destruir o buldozer e o camião. Era uma ação que fazia efeito e era esse o nosso objetivo. Porquê mudar?
O Chefe de Operações interrompeu:
— Nós somos militares. Nós devemos combater o inimigo. Por isso penso que a primeira ação nesta área devia ser militar. Os soldados devem andar à vontade na estrada. Esta picada vai de certeza dar à estrada. Uma emboscada era muito melhor. Os trabalhadores? Não vejo qual o interesse. Se ainda fosse para os fuzilar... Mas não. Para os politizar! Vocês acreditam que vamos politizar alguma coisa? Aqui só a guerra é que politiza.
O Comandante disse:
— Comissário, sei que uma operação política e económica tem interesse. O problema é o seguinte: se destruímos estes aparelhos, a ação militar está estragada, pois os tugas ficarão prevenidos de que andamos por aqui...  
[...]
O Comando reuniu em seguida. Decidiu guardar os trabalhadores por um dia, caminhando em direção ao Congo. Depois libertariam os trabalhadores e voltariam para o mesmo sítio, entre a picada e a estrada. Nesse dia, os tugas não ousariam aproximar-se. No dia seguinte, os trabalhadores iriam dizer que os guerrilheiros tinham voltado ao Congo e os soldados cairiam, sem contar, numa emboscada. O que faria pensar que vários grupos atuavam ali.
[...]
No ponto de recuo, os responsáveis controlaram os combatentes: Alvorada tinha um ferimento ligeiro no ombro e Muatiânvua ainda não tinha chegado. Esperaram Muatiânvua, enquanto Pangu-Akitina tratava do ferido. Muatiânvua não aparecia.
– Deve ter apanhado – disse o Comissário. – É preciso ir buscá-lo.
— Não pode – disse Milagre. – Eu estava ao lado dele e não o vi apanhar.
— Viste-o recuar? – perguntou o Comandante.
— Não.
— Então, pode ter apanhado no recuo. Quem é voluntário para o ir buscar?
Os guerrilheiros contemplaram-se, hesitando. Os soldados continuavam a fazer fogo e era arriscado voltar ao sítio da emboscada, mais perigoso que fazer a emboscada. Lutamos e Ekuikui ofereceram-se. Teoria não se ofereceu, notou Sem Medo. Está a fazer progressos, noutra altura teria de ser voluntário, por afirmação. O Comandante deixou partir os dois voluntários e depois disse:
— Ninguém se queria oferecer, porque Muatiânvua é um destribalizado. Fosse ele kikongo ou kimbundo e logo quatro ou cinco se ofereceriam... Quem foi? Lutamos, que é cabinda, e Ekuikui, que é umbundo. Uns destribalizados como ele, pois aqui não há outros cabindas ou umbundos... É assim que vamos ganhar a guerra?
O soldado aterrorizado que deixara encravar a arma devia ser minhoto ou transmontano. E os outros minhotos ou transmontanos disparavam raivosamente para o cobrir. Ao situarem de onde viera o tiro de Sem Medo que fizera desaparecer o olhar aterrorizado, todos os minhotos ou transmontanos dispararam raivosamente na sua direção. Não havia grande diferença!
Os dois voluntários não precisaram de chegar à emboscada, pois encontraram Muatiânvua, que se dirigia tranquilamente para o sítio de recuo.
— Que ficaste lá a fazer? – perguntou Sem Medo.
— A contar os mortos, para o Comunicado de Guerra! Havia 16 corpos na estrada, mortos ou feridos, quem sabe? Os outros estavam zangados, insultavam mal...
— Quando mando recuar, é para recuar! – gritou Sem Medo, para se convencer. Fizera um dia a mesma coisa e fora criticado e louvado ao mesmo tempo. Mudou logo o tom de voz: — Dezasseis, dizes tu? Não foi nada mau. Vamos embora.
E avançaram a corta mato, Lutamos à frente abrindo caminho com a catana. Até às seis horas, momento em que voltaram a encontrar o Lombe. Acamparam aí. Os soldados tinham parado de fazer fogo, certamente sem mais munições, mas a artilharia do Sanga continuava a gastar inutilmente obuses. Seria assim toda a noite. O combate durara dois minutos, constatou Sem Medo.

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